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Interesses chineses no Brasil - por Marcos Jank

A China sabe o que quer do Brasil. E nós, o que queremos dela?

São Paulo-28.04.2009-Marcos Sawaya Jank,presidente da UNICAfoto.Niels Andreas
São Paulo-28.04.2009-Marcos Sawaya Jank,presidente da UNICAfoto.Niels Andreas

A China sabe o que quer do Brasil. E nós, o que queremos dela?

Num mundo em desglobalização, precisamos saber quais são os interesses de nossos grandes parceiros, com quem e como vamos jogar.

Nesse contexto, a China é hoje o país com maior dependência e vontade de incrementar as relações com o Brasil. Para entender os seus mais recentes movimentos no país, vale ler o relatório “Investimentos Chineses no Brasil 2014-2015”, publicado em novembro pelo Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC).

A internacionalização das empresas chinesas é evidente, com vultosas aquisições nos setores de tecnologia, energia, agronegócio, financeiro, imobiliário, automotivo, eletrônico e de entretenimento. China e Hong Kong já investem globalmente mais de US$ 250 bilhões por ano, ou cerca de 20% do total mundial.

No caso do Brasil, o interesse estratégico chinês de longo prazo concentra-se basicamente em três áreas: energia, agronegócio e infraestrutura. No início, a China tentou investir direto em recursos naturais –terras agrícolas e minérios–, mas a estratégia não deu certo em razão das crescentes restrições impostas pelo governo brasileiro.

Mas em 2014 começa uma nova fase, na qual a China passa a se interessar não mais pela produção primária, mas pelo controle das cadeias de suprimento das principais commodities que ela demanda, a chamada “originação”. Na área de genética vegetal e defensivos, a ChemChina adquire a gigante suíça Syngenta, com grande presença no Brasil. Na área de grãos, açúcar e terminais portuários, a estatal COFCO compra a Nidera e a Noble Agri. Recentemente, o grupo privado Shanghai Pengxin adquire a Fiagril, empresa mato-grossense de insumos, grãos e logística.

Recentemente, surgem oportunidades para adquirir empresas-chave em setores afetados pela crise econômica e/ou por políticas regulatórias equivocadas. O caso mais notório é o da geração e transmissão de energia elétrica, com a aquisição da Cesp, de Furnas, da Eletronorte e da Duke Energy pelas estatais chinesas State Grid e China Three Gorges (CTG).

Não resta dúvida de que a Operação Lava Jato vai gerar grandes oportunidades para os chineses adquirirem empresas de construção civil e infraestrutura no Brasil.

São imensos os interesses chineses no Brasil, e hoje há muitas oportunidades para parcerias e aquisições. Mas erra quem pensa que esses interesses são comandados por uma estrutura hierárquica única e uniforme.

No excelente livro “The Political Economy of China-Latin America Relations in The New Millenium”, recém-lançado nos Estados Unidos, Margaret Myers e Carol Wise utilizam a teoria agente-principal para explicar o funcionamento do modelo de investimento. A China tem um único ator, que são os princípios e objetivos definidos pelo Partido e pelo governo. Mas a execução das diretrizes fica a cargo de múltiplos agentes –as companhias chinesas estatais e privadas–, que atuam com diferentes motivações e interesses, de forma competitiva e descoordenada. A isso se somam as imensas diferenças linguísticas, culturais e de identidade entre a China e a América Latina.

A expressão “negócio da China” tem sido usada sempre que alguém obtém grande vantagem em um acordo. O termo remonta aos lucros fabulosos que os comerciantes europeus obtinham com a venda de especiarias chinesas há mais de cinco séculos. Mas hoje a situação se inverteu e é o mundo que está oferecendo grandes “negócios para a China”.

Em suma, a China sabe o que quer do Brasil, agora e daqui a 50 anos. E nós, o que queremos dela? Vamos reduzir o nosso imediatismo doentio e olhar o longo prazo? Vamos nos organizar direito, com o governo e o setor privado refletindo e atuando em conjunto?