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Mercado de trabalho e pandemia: agronegócio evidencia resiliência frente a crises

Por Felipe Miranda de Souza Almeida, <span style="color: #333333; font-family: 'Open Sans', Arial, Georgia, sans-serif; font-size: 13px;">Pesquisador da área de macroeconomia do Cepea</span>

Mercado de trabalho e pandemia: agronegócio evidencia resiliência frente a crises

O agronegócio brasileiro se mostrou mais uma vez ser um setor resiliente em 2020, apresentando bons resultados em um momento de retrocesso da economia, diante dos impactos da covid-19. A crise sanitária até potencializou a fragilidade do mercado de trabalho do agronegócio e intensificou movimentos observados antes da pandemia, mas o setor mostrou sinais de recuperação da população ocupada (PO) já a partir do terceiro trimestre do ano, o que, com a retomada da atividade econômica e a manutenção do bom desempenho, pode trazer resultados positivos para o mercado de trabalho do agronegócio em 2021.

No ano passado, enquanto o PIB brasileiro recuou 4,1%, o PIB do agronegócio brasileiro (este calculado pelo Cepea/CNA pela ótica da renda real) acumulou avanço recorde, de 24,31% no ano, alcançando participação de 26,6% no PIB do Brasil. Isso evidencia que o agronegócio pôde contribuir significativamente com a economia brasileira sob diferentes aspectos, mesmo em um cenário de pandemia.

Em meados de abril de 2020, a expectativa de pesquisadores do Cepea[1] era de que os impactos da pandemia sobre o PIB e sobre o mercado de trabalho seriam diferentes, tendo em vista que, dentre outros fatores, os segmentos de grande peso na formação do PIB do agronegócio não são aqueles que detêm a maior relevância em termos de geração de empregos. Em geral, levando-se em consideração o ano de 2019, grande parte dos empregos do agronegócio estava no campo (45,25%), seguida por agrosserviços (32,44%), agroindústria (21,06%) e insumos (1,25%)[2].

Com as primeiras estatísticas disponíveis para 2020, ainda havia dificuldades em se mensurar os efeitos da covid-19 no Brasil sobre o mercado de trabalho. Nos três primeiros meses do ano, a população ocupada (PO) no agronegócio era de 17,97 milhões de pessoas, 0,53% a menos do que no mesmo período de 2019 e 1,55% abaixo do trimestre imediatamente anterior. Apesar de se observar uma tendência de queda no número de pessoas ocupadas no setor, este resultado foi influenciado especialmente pelo segmento primário, que apresentou redução de 1,97% na comparação entre o primeiro trimestre de 2020 e o mesmo período de 2019. Destaca-se o comportamento dos segmentos de insumos e agroindustrial, que, naquele momento, contribuiu para amenizar as quedas no número de ocupados na comparação entre os mesmos trimestres de 2019 e 2020.

No segundo trimestre, observou-se que a PO no agronegócio foi de 16,73 milhões de pessoas, 8,9% abaixo do mesmo período de 2019 e 6,91% inferior ao observado no trimestre imediatamente anterior. Ao analisar a evolução do mercado de trabalho por segmento do agronegócio, na comparação entre abril e junho de 2020 frente ao mesmo período de 2019, observou-se que a queda se deu em todos os segmentos, sendo as reduções mais significativas registradas na agroindústria e nos agrosserviços, superiores a 10% (o equivalente a  401,95 mil pessoas e 600,46 mil pessoas, respectivamente), enquanto na agropecuária a diminuição foi de 7,4% (ou de 622,52 mil pessoas) e, nos insumos, de 4,26% (ou de 9,91 mil pessoas). Estes movimentos foram atípicos ou de magnitude mais elevada do que o usual, estando relacionados, ao menos em parte, à crise da covid-19 e suas implicações sobre as atividades econômicas. Diante desses movimentos, a participação do agronegócio no mercado de trabalho brasileiro alcançou 20,07% no segundo trimestre de 2020, evidenciando que, apesar das expressivas quedas, o mercado de trabalho do agronegócio sofreu menos do que outros setores da economia brasileira.

No terceiro trimestre 2020, a PO no agronegócio foi de 16,94 milhões de pessoas, 7,58% a menos que no mesmo período de 2019. Analisando-se por segmento na mesma comparação, observa-se que a baixa ocorreu em todos os segmentos, com diferentes intensidades. Novamente, os recuos mais expressivos foram registrados nos segmentos agroindustrial e de agrosserviços, de respectivamente 11,58% (ou 451,84 mil pessoas) e 12,35% (ou 730,217 mil pessoas), enquanto na agropecuária a redução foi de 2,31% (191,17 mil pessoas) e, nos insumos, de 6,99% (ou 16,19 mil pessoas). Assim como no trimestre anterior, os movimentos estavam, ao menos em parte, relacionados à pandemia de covid-19, visto seu comportamento atípico ou de magnitude mais elevada. Entretanto, nesse período, já se observou uma leve recuperação dos postos de trabalhos ao se comparar o segundo e terceiro trimestres do ano, com a PO aumentando 1,3%, ou 216,97 mil pessoas. Esse era um indicativo de recuperação no mercado de trabalho do setor, após o período de abril a junho, considerado, até então, o mais crítico em termos dos efeitos da pandemia sobre o agronegócio.

No último trimestre do ano, a PO no agronegócio foi de 17,57 milhões de pessoas, 3,69% abaixo do registrado no mesmo período de 2019, mas 3,74% superior ao observado no terceiro trimestre de 2020, reforçando o indicativo de recuperação no mercado de trabalho do setor. Na comparação entre outubro e dezembro de 2020 frente ao mesmo período de 2019, com exceção da agropecuária, que apresentou crescimento de 2,88% (ou de 233,70 mil pessoas), os outros segmentos apresentaram quedas, com destaque para o agroindustrial (de 8,34%, ou de 325,61 mil pessoas) e o de agrosserviços (de 9,49%, ou de 570,04 mil pessoas). Na comparação do quarto trimestre de 2020 com o terceiro trimestre do mesmo ano, com exceção do segmento de insumos, os demais apresentaram uma expansão da PO.

Dessa forma, na média dos quatro trimestres, a PO no agronegócio brasileiro somou 17,30 milhões de pessoas em 2020, redução de 5,20% (ou de 948,61 mil pessoas) na comparação com 2019. Esse resultado refletiu os comportamentos diferenciados dos segmentos do setor, com baixas de 3,73% (ou de 8,46 mil pessoas) para insumos, de 2,25% (185,44 mil pessoas) para primário, de 7,24% (278,35 mil pessoas) para agroindústria e 8,04% (476,34 mil pessoas) para agrosserviços. Como destacado anteriormente, esse comportamento foi reflexo, ao menos em parte, da crise ocasionada pela pandemia de covid-19 sobre a atividade econômica e, consequentemente, sobre o nível de emprego do setor, mas que foi amenizado pelo desempenho do número de PO no agronegócio observado nos últimos dois trimestres do ano.

Em termos de posições na ocupação e categorias de emprego para o Brasil, na comparação entre 2019 e 2020, as maiores reduções ocorreram para os empregados com e sem carteira assinada e trabalhadores por conta própria. No agronegócio, o comportamento foi similar, com quedas de 380,48 mil pessoas para empregado com carteira assinada, de 426,98 mil pessoas para empregado sem carteira assinada, de 106,76 mil pessoas para categoria trabalhador por conta própria e de 56,96 mil pessoas para a categoria empregador.

Para a posição empregado com carteira assinada, o segmento que mais influenciou o resultado foi o de agrosserviços, com recuo de 227,63 mil pessoas. Para os sem carteira assinada, o maior impacto veio da agropecuária (-215,67 mil pessoas), seguida pelos agrosserviços (-129,55 mil pessoas) e pela agroindústria (-80,34 mil pessoas). Já para a categoria trabalho por conta própria, a queda foi reflexo das reduções observadas nos segmentos agroindustrial (-96,91 mil pessoas) e agrosserviços (-85,31 mil pessoas), uma vez que houve resultado positivo para a agropecuária (83,95 mil pessoas).

 

[1] Ver https://cepea.esalq.usp.br/br/documentos/texto/especial-coronavirus-e-o-agronegocio-volume-2.aspx
[2] Série histórica do mercado de trabalho do agronegócio brasileiro disponibilizado pelo Cepea em https://www.cepea.esalq.usp.br/br/mercado-de-trabalho-do-agronegocio.aspx