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Negócios

Nova regulamentação muda cenário para Certificados de Recebíveis do Agronegócio

Investidor que mora no Brasil também poderá comprar CRA em dólar

Nova regulamentação muda cenário para Certificados de Recebíveis do Agronegócio

A partir de novembro, investidores que residem no Brasil poderão comprar os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) “em dólar”, classe de ativos que, hoje, só está disponível a pessoas que moram fora do país. Na opinião de quem trabalha na área, a mudança, regulamentada recentemente pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), tem potencial de movimentar recursos na casa dos bilhões de reais já no ano que vem e fazer do agronegócio o segmento com maior participação no mercado de capitais brasileiro.

A liberação de CRAs com cláusula de variação cambial também para quem reside no Brasil pode dar a empresas e produtores rurais um instrumento para simplificar suas operações. Com o papel “em dólar”, esses investidores poderão “casar” o financiamento e a moeda que já compõe grande parte de seus custos e receitas. Empresas e produtores também poderão contornar a necessidade de outras operações, como hedge e swap cambial.

Antes da regulamentação, quando esse tipo de emissão só estava disponível a pessoas que moram no exterior, o instrumento não deslanchou. Em parte, o fraco desempenho deveu-se a incertezas no mercado sobre algumas questões fiscais, entre eles o tratamento tributário da variação cambial. Para muitos investidores, essas dúvidas tornavam a operação muito arriscada. A emissão para residentes nasce sem o peso dessa insegurança: há isenção de IOF e Imposto de Renda para os investidores que moram no país, inclusive sobre a correção do câmbio.

“O investidor local que comprar um título indexado à variação cambial estará sujeito às mesmas regras aplicadas aos CRAs emitidos em reais. Isso inclui a isenção para pessoas físicas”, diz Cristian Fumagali, sócio da Ecoagro, securitizadora líder na emissão do título no país. Segundo ele, a empresa já recebeu consultas de clientes interessados na nova modalidade. “As primeiras estruturações devem ocorrer até o meio de 2022, já olhando para os financiamentos da safra de verão do próximo ano”.

O CRA “em dólar” para residentes no país era uma demanda antiga do mercado, mas ainda dependia de um certo amadurecimento do agronegócio no mercado de capitais para ser autorizado. O governo federal vinha adiando a medida por receio de que ela aumentasse a volatilidade do câmbio ou criasse uma alavancagem excessiva em dólar ou outra moeda estrangeira. Para dirimir a exposição ao risco, apenas investidores profissionais e qualificados poderão operar na modalidade.

“Não permitir que o agronegócio trabalhe com variação cambial é incongruente, já que grande parte do setor tem custos e receitas em dólar”, disse o advogado Bruno Cerqueira, sócio do escritório Tauil e Chequer. Isso também vale para pequenos e médios produtores. Empresas maiores, de setores de açúcar e álcool, papel e celulose, carnes e tradings de grãos, ou que já captam no exterior terão ainda mais facilidade. “A mudança vai estimular o mercado de captação doméstico porque os investidores que residem no país poderão comprar o CRA sem precisar investir capital no exterior, e as empresas vão poder captar dentro do país”, afirma.

Para Lúcio Feijó, sócio sênior da área de agronegócio e mercado de capitais do Feijó Lopes Advogados, as novas regras terão “impacto positivo para o agro”, permitindo a captação de recursos dentro do país atrelados à variação da moeda estrangeira e abrindo a possibilidade de uma nova classe de ativo aos investidores.

A demanda por títulos como o CRA cambial tem crescido de maneira acentuada. “Ainda não existiam (papéis como esse), a não ser fundos expostos, investimentos diretos em dólar. Ele abre ao investidor brasileiro uma boa janela para a formação de portfólios mais saudáveis”, afirma Bruno Novo, sócio da área de mercado de capitais do Investment Banking da XP.

Outras fontes de financiamento vão continuar

Como a demanda dos produtores rurais por recursos é alta e o avanço do crédito não consegue acompanhar o crescimento do agronegócio no país, o instrumento não deve anular outras fontes de financiamentos ou ocupar o espaço delas, acredita Novo. A XP já tem conversado com diversos interessados e recebido sinal verde para organizar o investimento no CRA cambial.

Tiago Lessa, sócio do Pinheiro Neto Advogados, diz que o pacote de novos instrumentos de crédito – que inclui, além do CRA cambial, também o Fiagro – aproximará ainda mais o campo do mercado de capitais. “No médio prazo, essa combinação fará do agronegócio o setor que mais acessa o mercado de capitais ”, aposta.

Na prática, a não ser pela inclusão da cláusula de variação cambial, os papéis pouco vão mudar: o título continuará a ser um ativo em reais, mas com flutuação em dólar ou outra moeda. Na estruturação dos novos CRAs, os desafios passarão pela definição de parâmetros, precificação e engajamento do mercado. No ano passado, as emissões de CRAs somaram R$ 15,8 bilhões, e os títulos em estoque chegaram a quase R$ 48 bilhões.