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Nutrição

Glicerol na alimentação de aves e suínos

Conheça as vantagens, desvantagens, benefícios, entre outros fatores.

Glicerol na alimentação de aves e suínos

Subproduto da síntese de Biodiesel, a glicerina ou glicerol se tornou um fator preocupante frente ao destino deste, já que para cada tonelada de biodiesel obtido são gerados 100 kg de glicerol, provocando efeitos adversos à economia, e podendo também se tornar um possível fardo para o meio ambiente. No entanto, pesquisas indicam que a aplicação de glicerol na alimentação de aves e suínos pode apresentar vantagens econômicas e ambientais. 

Em entrevista exclusiva, a médica veterinária Carmen Neusa M Cortada, da NBCC Consultoria, fala sobre o Glicerol e sua aplicação na cadeia de nutrição animal. Acompanhe: 

AI/SI – Definição: O que é Glicerol? Como ele pode ser obtido? 

Carmen- Segundo EFSA (2010) Glicerina, ou glicerol (1,2,3,-propanotriol) é um álcool orgânico. O glicerol é um tri-álcool, ou seja, sua molécula é formada por um esqueleto carbônico ao qual estão ligadas três hidroxilas. É um líquido viscoso, inodoro, incolor, com sabor ligeiramente adocicado. 

Os produtos com esta denominação podem apresentar diferentes graus de pureza. Os considerados “USP grade”, ou grau alimento, pela Farmacopeia Americana (USP – United States Pharmacopeia), podem ser empregados como ingredientes de alimentos (EFSA, 2010). 

Segundo FDA o glicerol, ou glicerina, é um produto classificado como um macronutriente calórico. Como aditivo alimentar é especificado com o número E422. 

Se a glicerina bruta obtida contiver no máximo 0,5% de metanol e, cerca de 1% de outras substâncias orgânicas, ela pode ser classificada, segunda a Agência Francesa de Segurança Sanitária de Alimentos (AFSSA), como um produto não prejudicial para uso em alimentação animal (EFSA, 2010). 

Pode ser obtido de fontes animais, vegetais, resultante de processos industriais e como subproduto da produção de biodiesel. Como o biodiesel pode ser obtido a partir de diferentes fontes a glicerina bruta resultante deste processo pode ter sua composição variável. Além de glicerina, que perfaz em torno de 80%, pode conter água, sais de Na ou de K, ácidos graxos livres e metanol ou etanol. 

É empregado na produção dos mais variados produtos desde alimento, passando por cosméticos e até dinamite. 

Na indústria de alimentos é empregado como umectante, solvente, preservativo, adoçante e emulsificante na indústria de margarinas, entre outros. 

Na indústria de cosméticos como emoliente. 

Tem efeito de anticongelante. É ingrediente frequente na indústria de medicamentos e é frequentemente usado como protetor celular nos processos de congelamento de células, embriões e sêmen. 

Nos organismo humano e animal o glicerol é um álcool integrante dos triglicerídeos, importantes para o metabolismo. 

AI/SI – A aprovação do glicerol pelo Mapa como ingrediente para ração animal desperta novo interesse no uso do subproduto. Isto é interessante de que forma na criação de aves e suínos? 

Carmen- O produto poderá ser empregado na dieta animal com o objetivo de servir como alimento energético substituindo parte do milho. 

A glicerina pura apresenta aproximadamente 4,3 Mcal/kg de energia bruta (Kerr et al, 2009), mas que pode variar em função da composição. 

Os teores de energia metabolizável (EM) para aves e suínos são variáveis nos trabalhos experimentais. 

Bartlet e Schneider (2002) observaram teores de EM da ordem de 3003, 3020 e 3292 kcal/kg para frangos, poedeiras e suínos, respectivamente. Verificaram também que os teores de EM da glicerina para aves (poedeiras, frangos) e suínos diminuem à medida que o teor deste ingrediente aumenta na dieta, especialmente quando mais de 10% é adicionado à dieta. 

A glicerina é altamente digestível para aves e suínos, atingindo aproveitamento de 97% da energia consumida (Kerr et al, 2011). 

Na dieta de suínos pode ser empregado acima de 10% de glicerina bruta (Kijora e Kupsch, 2006). No entanto, em experimento no Brasil, Berenchtein (2008) verificou que para suínos em crescimento e terminação poderiam ser empregados até 9% de glicerol na dieta sem afetar o desempenho e características de carcaça. 

AI/SI – Comente os prós e os contras da adoção desta substância: 

Carmen- O uso desta substância na dieta animal poderá servir de alternativa para substituir parte dos alimentos energéticos, especialmente os alimentos à base de milho na dieta animal. Isto poderá contribuir para diminuir o custo da ração, visto que, o preço do glicerol tem baixado constantemente devido ao aumento da produção em função dos programas para obtenção de biodiesel. 

Além do mais, em pouco tempo, se não houver aumento na demanda de glicerol, este passará a ser um problema devido ao excesso de produção com a aceleração do programa de produção de biodiesel. 

No entanto a utilização do glicerol demanda alguns cuidados, em função da glicerina bruta poder conter metanol, substância potencialmente tóxica.

Outro fator é a possibilidade da glicerina poder apresentar sais como sódio ou potássio na sua composição, o que demanda cuidado no balanceamento da dieta para que o teor na dieta não fique acima de níveis recomendados. 

O biodiesel se produzido a partir de mamona ou pinhão manso pode gerar um subproduto contaminado com substâncias tóxicas, provenientes destas fontes, como ácido ricinoleico (Amstalden, 2009). Estas substâncias podem levar à diarreia e diminuição de desempenho.

Além disto, alguns autores consideram que a adição de glicerol à ração peletizada poderá alterar a qualidade do pellet, prejudicando a sua utilização por causar problemas para os equipamentos e sistemas de alimentação automáticos, pois pode haver dificuldade para ração fluir nos sistemas de alimentação, o que interfere com consumo animal. 

No entanto, ainda quanto à interferência na qualidade do pellet há autores que reportam como favorável a utilização do glicerol por facilitar a peletização e  por diminuir o custo energético da peletização na fábrica de ração, além de, no caso de ração fareladas diminuir a formação de pó. 

AI/SI – O Glicerol favorece o ganho de peso e o crescimento de aves e suínos? Como? 

Carmen- Os resultados de emprego de glicerol na dieta de monogástricos tem sido contraditórios.

Alguns experimentos concluem ser esta substância uma boa fonte de energia altamente disponível para suínos em crescimento (Lammers, et al. 2008) e outros experimentos verificaram diminuição da energia metabolizável (EM) dependendo do nível de glicerol acrescentado à dieta (Barteld e Schneider, 2002). 

O fornecimento de dieta contendo 8% de glicerol bruto a suínos em crescimento e terminação resultou numa melhoria de 3% na taxa de crescimento, mas numa diminuição de 2% da eficiência no ganho de peso, quando comparado com o desempenho em dieta à base de soja mais milho (Schieck et al., 2010)

AI/SI – A qualidade da carcaça e da carne de frango e/ou suína é alterada de que forma com a adoção do Glicerol? 

Carmen- Em uma revisão a respeito de uso de glicerina na dieta de não ruminante, Kerr et al (2008) relataram que a maioria dos trabalhos não verificou alteração na qualidade da carcaça quando o glicerol é adicionado à dieta em níveis de até 10%.

 AI/SI – O Glicerol é apenas um aditivo ou pode substituir algum ingrediente na ração?

Carmen- O glicerol é classificado no grupo de alimentos denominados de alimentos energéticos e portanto está no mesmo grupo do milho. 

AI/SI – Como balancear a dieta para potencializar a avicultura e suinocultura com o uso do Glicerol? 

Carmen- Balancear a dieta tomando o cuidado com os teores de contaminantes como metanol, Na e K, que poderão ser prejudiciais ao desempenho e à saúde se estiverem acima dos recomendados. 

Viabilidade 

AI/SI – Na disponibilidade da glicerina bruta no Brasil aumentou consideravelmente nos últimos anos, por isso o Mapa busca alternativas para o excesso de produção e o aprovou como ingrediente energético em rações. Com isso, a senhora acredita que no Brasil é possível a adoção nas criações em larga escala?

Carmen- Sim, para rações não somente de aves e suínos, mas também de outras espécies.

No entanto, este uso exige um rígido controle de qualidade pelas empresas fiscalização pelos órgãos competentes para que o  material disponibilizado como categoria alimento esteja com sua composição dentro dos parâmetros normais, em consonância com o que  é exigido pelo Mapa. 

AI/SI – Quais dos desafios/entraves para esta adoção?

Carmen- O preço deve ser competitivo em relação aos ingredientes à base de milho e soja. 

AI/SI – Há tabelas/gráficos comparativos de uma ração feita basicamente de milho e soja e outra com adição de Glicerol? Pode fornecê-los (para aves e suínos)? 

Carmen- Em trabalho de revisão sobre emprego de glicerol na dieta de aves e suínos Menten considerou que o emprego de glicerina nas dietas de aves e suínos poderá promover uma redução na quantidade de milho. No entanto, a dieta deverá contar mais farelo de soja para compensar a diminuição do teor de proteína.

Como nas rações para frangos, o aumento do farelo de soja implica em redução da energia esta teria que ser suplementada com óleo, para compensar esta perda energética. Por esta razão, o valor da glicerina seria menor como ingrediente em rações de frangos quando comparado às rações de suínos. 

REFERÊNCIAS:

Amstalden, N. Com mais biodiesel, sobra glicerina e crescem riscos de diarreia. Com Ciência – SBPC/Labjor, 14/12/2009 Acessado em 8/07/2012

Berenchtein, Bernardo. Utilização de glicerol na dieta de suínos em crescimento e terminação. Tese de Mestrado, ESALQ, Universidade de São Paulo. 45p. 2008.

EFSA Panel on Contaminants in the Food Chain (CONTAM)- Scientific Opinion on the abiotic risks for public and animal health of glycerine as co-product from the biodiesel production from Category 1 animal by-products (ABP) and vegetable oils. European Food Safety Authority EFSA Journal 2010; 8 (12): 1934.

Kerr,B. J.;  Shurson, G. C.; Johnston, L. J. e Dozier, III,  William A. Utilization of Crude Glycerin in Nonruminants. In: Biodiesel- Quality, Emissions and By-Products, Capítulo 11, 2011. ISBN: 978-953-307-784-0; DOI: 10.5772/26039 _ Acessado em 04/07/2012.

Kijora, C. e S. D. Kupsch. Evaluation of technical glycerols from  “biodiesel” production as a feed component in fattening of pigs. Lipid-Fett. 98 (7): 240 – 245, 2006.

Lammers, P. J. et al. Digestible and metabolizable energy of crude glycerol for growing pigs. Journal of Animal Science, 86: 602-608, 2008.

Menten, J. F. M.; Miyada, V. S. e Berenchtein, B. Glicerol na alimentação animal. 2009. http://www.agrolink.com.br/downloads/glicerol_2009-03-13.pdf.  Acessado em 09/07/2012

Penz Junior, A. M. e Gianfelice, M. O que fazer para substituir os insumos que podem migrar para a produção de bio-combustível. Acta Scientiae Veterinariae. 36 (Supl.1): s107-s117, 2008.

Schieck, S. J. ;Shurson, G. C.; Kerr, B. J. e Johnston, L. J.. Evaluation of glycerol, a biodiesel coproduct, in grow-finish pig diets to support growth and pork quality. Journal of Animal Science, 88: 3927 – 3935, 2010.